sexta-feira, 31 de agosto de 2012
O Cercado de Paula Tavares
PAULA TAVARES
O CERCADO
De que cor era o meu cinto de missangas,
mãe
feito pelas tuas mãos
e fios do teu cabelo
cortado na lua cheia
guardado do cacimbo
no cesto
trançado das coisas da avó
Onde está a panela do provérbio,
mãe
a das três pernas
e asa partida
que me deste antes das chuvas grandes
no dia do noivado
De que cor era a minha voz,
mãe
quando anunciava a manhã junto à cascata
e descia devagarinho pelos dias
Onde está o tempo prometido p'ra viver,
mãe
se tudo se guarda e recolhe no tempo da espera
p'ra lá do cercado
in DIZES-ME COISAS AMARGAS COMO OS FRUTOS (Ed. Caminho, 2011)
MIA COUTO, Sem depois
MIA COUTO,
SEM DEPOIS
Todas as vidas gastei
para morrer contigo.
E agora
esfumou-se o tempo
e perdi o teu passo
para além da curva do rio.
Rasguei as cartas.
Em vão: o papel restou intacto.
Só os meus dedos murcharam, decepados.
Queimei as fotos.
Em vão: as imagens restaram incólumes
e só os meus olhos se desfizeram, redondas cinzas.
Com que roupa
vestirei minha alma
agora que já não há domingos?
Quero morrer, não consigo.
Depois de te viver
não há poente
nem o enfim de um fim.
Todas as mortes gastei
para viver contigo.
in IDADES CIDADES DIVINDADES (Caminho, 2007)
POENTE de ALVES REDOL
POENTE
Final de dia, sereno, tropical.
Laivos rubros no azul do firmamento...
E o Sol lança um beijo maternal Sobre a Terra –
um beijo a seu contento - .
Passam negras levando o seu bornal,
Como se fossem levadas pelo vento,
E pirogas, temendo o vendaval,
Atravessam a baía num momento.
A ilha de palhotas e palmeiras,
Junto à ponte, a água em cachoeiras,
Tudo isto, para mim era fatal...
Olhava o mar cheio de ansiedade...
Ia com êle a mais triste saudade: -
A saudade de meus Pais, de Portugal.
ALVES REDOL de Vida Ribatejana, 29 novembro 1931
Final de dia, sereno, tropical.
Laivos rubros no azul do firmamento...
E o Sol lança um beijo maternal Sobre a Terra –
um beijo a seu contento - .
Passam negras levando o seu bornal,
Como se fossem levadas pelo vento,
E pirogas, temendo o vendaval,
Atravessam a baía num momento.
A ilha de palhotas e palmeiras,
Junto à ponte, a água em cachoeiras,
Tudo isto, para mim era fatal...
Olhava o mar cheio de ansiedade...
Ia com êle a mais triste saudade: -
A saudade de meus Pais, de Portugal.
ALVES REDOL de Vida Ribatejana, 29 novembro 1931
Pensamento
Por isso nos emociona com sua confiança
Sensibilidade e docilidade, nos acalma.
Como é cristalino o sorriso de uma criança! "(autor desconhecido)retirado da net
quarta-feira, 29 de agosto de 2012
Saudades Mia Couto
Saudades
Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
...
Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
...
ferindo-se de ternura
dói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono
In "Raiz de Orvalho e outros poemas"
dói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono
In "Raiz de Orvalho e outros poemas"
domingo, 26 de agosto de 2012
Poema de Antonio Aleixo
"Embora os meus olhos sejam
os mais pequenos do mundo
o que importa é que eles vejam
o que os homens são no fundo
Que importa perder a vida
na luta contra a traição
se a razão mesmo vencida
não deixa de ser razão
Vós que lá do vosso império
prometeis um mundo novo
calai-vos que pode o povo
querer um mundo novo a sério
Eu não tenho vistas largas
nem grande sabedoria
mas dão-me as horas amargas
lições de filosofia."
António Aleixo
É Doce Morrer no Mar -Marisa Monte & Cesária Évora -
É doce morrer no mar,
Nas ondas verdes do mar
A noite que ele não veio foi,
Foi de tristeza pra mim
Saveiro voltou sozinho
Triste noite foi pra mim
É doce...
Saveiro partiu de noite, foi
Madrugada não voltou
O marinheiro bonito
Sereia do mar levou.
É doce...
Nas ondas verdes do mar, meu bem
Ele se foi afogar
Fez sua cama de noivo
No colo de Iemanjá
MIA COUTO, Elementos
MIA COUTO,
ELEMENTOS
Era água, mas ardia.
No centro do teu corpo ardia.
Como um sol em plena chuva ardia.
Era boca, mas navegava.
Entre beijo e barco se perdia, água já sem viagem, navegava.
Rumo a um destino que fica depois do lugar derradeiro navegava.
Pensei que era a noite, mas era a terra.
Em mim se deitava um corpo e era eu que me erguia vazio como um rio nu.
Terra que entreabria e penetrava e, afinal, era semente, flecha de luz, cinza antes de fogo, semente. No falso suicídio da estrela-cadente era terra, água, semente,
Tu. in IDADES CIDADES DIVINDADES (Caminho, 2007)
Para ti Mia Couto
Para ti
Mia Couto
Foi para ti
...
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida
Imagem: Desconheço autoria
Mia Couto
Foi para ti
...
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida
Imagem: Desconheço autoria
terça-feira, 21 de agosto de 2012
segunda-feira, 13 de agosto de 2012
sábado, 11 de agosto de 2012
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
sábado, 4 de agosto de 2012
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